O jornal El País publica nesta quinta-feira (16/1) uma reportagem intitulada "A rebelião dos excluídos", que traz a opinião de especialistas brasileiros sobre o fenômeno chamado rolezinho, uma forma de protesto que vem se alastrando pelas capitais do Brasil. A reportagem diz que os rolezinhos começaram a chamar a atenção a partir do dia 7 de dezembro, quando cerca de seis mil jovens se reuniram através de redes sociais no metrô Itaquera, centro comercial na Zona Leste de São Paulo, uma das regiões mais pobres da cidade.
O grupo, em sua maioria negros e mestiços, apareceu no shopping, representando um "risco para a nova classe média". Os jovens usavam bonés e shorts, além de gostaram de funk. Desde aquele dia, pelo menos quatro outros rolezinhos, definido pela polícia como motins, foram repetidos em diferentes pontos de São Paulo, com casos isolados de roubo. Ao todo, causou pânico entre os compradores e comerciantes.

Segundo o El País, o Brasil vem colecionando histórias de discriminação em seus centros de consumo. O veículo relembrou que em dezembro, um músico cubano e negro foi indenizado com R$ 6,7 mil pela Justiça, por ter sido vítima de preconceito ao ser abordado e levado para uma sala por vigilantes do Shopping Cidade Jardim, o mais luxuoso de São Paulo. No ano de 2000, um grupo de moradores de uma favela carioca chegou a um centro comercial localizado na Zona Sul da cidade e foram recebidos pelos segurança do shopping com atos de preconceito.
Mas na semana passada, o fenômeno rompeu as fronteiras da periferia paulista, na visão do El País. A matéria destaca que a decisão de um juiz para proibir os rolezinhos e ameaçar seus praticantes com uma multa de 10.000 reais (4.234 dólares), juntamente com a repressão policial, teve em vista uma nova reunião de cerca de 1.000 jovens no shopping Itaquera Metrô, que mobilizou as redes sociais em todo o país e foi algo reacionário de violência policial.
Agora, dez novos rolezinhos foram marcados para as próximas semanas em apoio aos jovens da periferia, incluindo um no JK Iguatemi, um dos mais caros em São Paulo, após a decisão do juiz de autorizar os shoppings de revistarem e proibirem a entrada de suspeitos, como aconteceu no último sábado (11/1). PÁGINA PRINCIPAL entrevistou quatro intelectuais que discutiram o fenômeno e as suas naturezas, analisando a resposta do Estado e da sociedade.
PAULO LINS (escritor, autor de Cidade de Deus)
"Não vejo nada neste fenômeno espontâneo"
O rolezinho é uma forma de chamar a atenção para o fato de que o Brasil é um país racista e que demonstra ser uma manifestação política extremamente organizada. Não vejo nada neste fenômeno espontâneo. Eu acho que o debate público sobre a periferia do Brasil é muito grande. Desde os anos 90, música, literatura, poesia, política e rap são universos dos jovens e os que estão ligados com a política, devem ouvir as pessoas, debater, e eu até organizo várias discussões com as crianças em favelas. Os políticos não estão percebendo que a periferia está mudando, já não aceitando excessos políticos. Hoje conversando com um adolescente de 15 anos, você sabe tudo o que está acontecendo, tem as mesmas ideias como um jovem do centro da cidade.
A resposta das autoridades para o rolezinho não é nova, ele sempre foi assim. Se entrar cinco negros em uma alameda, serão observados. Polícia brasileira é a que mais mata os jovens negros. Toda a gente sabe isso. O Brasil é um país racista, como a maioria dos países da Europa ou nos Estados Unidos, o que acontece no mundo e os jovens da periferia estão cansados de ver isso. Uma menina de 15 anos que vive em uma favela recebeu 1.000 reais (423 dólares), como um presente de aniversário de seu pai para comprar um vestido. Percorreu um montão de lojas de marca e não conseguiu comprá-lo. Eu tenho um amigo francês, negro, que chegou nas lojas de Ipanema e, mesmo sem saber se ele queria comprar, logo o atenderam, pois ouviram o sotaque.
Mas o problema não é que as pessoas são racistas, é que as instituições são racistas. Eu não posso mudar o racismo pessoal, agora, quando é o Estado que é racista, temos um problema. Esta forma de racismo está causando violência. A classe média inteligente vai entender que, assim como aqueles que tratam as crianças em shoppings, são os principais motivos que causam violência.
A classe média tem que abraçar esta causa de viver em um país melhor. Robo foi sempre assaltos em massa e em qualquer situação. O importante é que as pessoas que fazem isso estão lá também. O mais importante para nós, para a imprensa, deve ser o fato político.
Ruda RICCI (doutor em ciências sociais e autor do livro "Nas Ruas" em protesto de Junho)
"Quem é este jogo infantil é politizar a polícia"
Os rolezinhos nasceram de sentimentos que se cruzam. O primeiro resultado da inclusão induzida pelo consumo lulismo. Não houve a inclusão social através da luta pelos direitos (motivada por protestos e manifestações sociais, vitorioso, identidade social e gerar políticas) ou político (fruto do compromisso sindical ou partidário).
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