sábado, 8 de abril de 2017

O Brasil do avesso: A ousadia dos foras da lei.

JÁ NÃO SEI se li, vi ou se apenas delirei sobre a existência de um mundo do avesso. Neste mundo o Pinóquio não mentiria, pelo contrário só falaria a verdade e seria “tentado” a todo momento pelo grilo falante a mentir e a cometer desatinos; o Lobo Mau seria devorado por Chapeuzinho Vermelho; o Zorro seria preso todos os dias pelo sargento Garcia; Eliot Ness seria preso por Al Capone; o mal seria o valor moral em detrimento do bem; o certo seria o errado e este (errado) o correto.
Situações assim só são imagináveis num mundo de ficção científica. E não falo apenas das fábulas.
O Brasil, de uns tempos para cá, resolveu tornar-se esse mundo de ficção: um país do avesso, visto a partir da imagem invertida através do espelho.
Onde você imaginaria um seminário para contestar ações da Polícia Federal, do Ministério Público e do Poder Judiciário no combate à corrupção desenfreada? Onde se imaginaria os servidores públicos imbuídos deste propósitos – às vezes com o risco da própria vida –, serem tachados como inimigos públicos? Ora, no Brasil.
O Partido dos Trabalhadores – PT, esteve no comando do país de janeiro de 2003 a agosto de 2016, quando a presidente Dilma Rousseff teve o mandato cassado. Neste tempo vimos crescer, como política de Estado, os maiores esquemas de corrupção que se tem notícia no mundo, em todos os tempos. Os esquemas tinham dois propósitos básicos: o aparelhamento do Estado para continuarem hegemônicos e o enriquecimento de seus membros, aliados, partícipes do saque da nação.
Os esquemas que vieram à tona desde o chamado escândalo do “mensalão” – em que parte da cúpula partidária foi compelida a conhecer o sistema carcerário a partir da perspectiva interna –, estão sendo desmontado na chamada Operação Lava-Jato, graças ao trabalho de policiais, delegados da Polícia Federal, procuradores e juízes, principalmente os vinculados a operação sediada em Curitiba, Paraná.
A operação, além de trazer ao sol todo lamaçal de corrupção que afundava (e afunda) o país, está sendo responsável, até certo ponto, pela restituição do alcance e por uma certa mudança de atitude de algumas empresas públicas e privadas.
Apesar disso – e talvez por conta disso –, começam a levantar-se tantas vozes contra a atuação de policiais, procuradores e juízes.
E, é neste ponto que o país parece ter enveredado pelo avesso.
Fico perplexo com as coisas destes tempos. Outro dia o Partido do Trabalhadores – PT fez um seminário intitulado “O que a Lava Jato tem feito pelo Brasil”. Um incauto pensaria que o partido, que foi criado sob o discurso da ética, da moral e do combate à corrupção, iria cerrar fileiras na defesa da operação. Ledo engano. O seminário teve o propósito justamente contrário. Para os valentes do partido e seus apoiadores, a Operação Lava Jato é uma ameaça a democracia, é um desrespeito a Constituição, um ataque ao estado indutor do crescimento, que transformou o país num estado de exceção, e tantas outras aleivosias.
Em resumo, para estes valentes, a corrupção é menos danosa ao país que o seu combate. O combate à corrupção é o verdadeiro mal do Brasil da atualidade.
São os policiais, procuradores e juizes, os verdadeiros inimigos da pátria e não os ladrões que enricaram enquanto crianças ficavam sem escolas, enquanto pacientes morriam, enquanto as safras se perdiam por falta de infraestrutura. Combater a corrupção levou o país a quebradeira de empresas, do comércio…
A discursão chegou a esse patamar. E, vejam que não sou defensor de muitas coisas feitas no curso de tal operação, sou contra o espetáculo midiático, não duvido que tenha ocorrido algum abuso (ou abusos), por vezes, acho que alguns destes agentes, em nome da causa, ou imbuídos de bons propósitos (de bem-intencionados o inferno está cheio), tenham buscado a promoção pessoal. Mas o que se está discutindo não é isso.
A pauta dos que aproveitaram o poder conferido pelo povo para se locupletarem não é essa. A pauta destes é se dizerem vítimas. Eles, ladrões do dinheiro público são as vítimas enquanto que aquelas pessoas que estão, com o risco da própria vida, desmontando seus esquemas corruptos, são algozes. Al Capone passar-se por vítima, nem precisamos dizer que o Brasil é o país da piada pronta.
Ainda com as insanidades do tal seminário, ou as diversas teorias conspiratórias que inventam dia sim e no outro também na mídia, não se mostram satisfeitos, tentam escapar de todos os malfeitos que praticaram pela porta da politização.
É como se nos dissesse: tudo que estamos assistindo é uma trama diabólica dos inimigos do Brasil, dos imperialistas americanos, da direita internacional, da rede globo e todos os demais inimigos de sempre.
Querem que acreditamos que os delatores, que estão confessando e restituindo parte do roubo são todos mentirosos. Devem ser. E aquelas contas recheadas de dinheiro no Brasil e no exterior não existem, nunca existiram, estão devolvendo o dinheiro em solidariedade ao país. São beneméritos
Agora mesmo um “coletivo” de juristas assinam um manifesto acusando um juiz de parcialidade apresentando como provas meras especulações de cunho político.
Outro dia foi a vez de um pré-candidato, no caso, o senhor Ciro Gomes, bravatear: “ele que mande me prender. Vou receber a turma dele na bala”. Pelo contexto da bravata, o “ele” é o juiz Sérgio Moro, a “turma dele” a que se referiu deve ser a Polícia Federal.
Vejam se não vivemos num país onde as coisas estão fora de ordem. O suposto presidenciável do PDT, vestido de coronel do século 19, trata as instituições que deveria respeitar como se estivesse na sua fazenda. Não que sua bravata tenha qualquer efeito prático, até onde se sabe não responde, até aqui, por nenhuma conduta tida por ilícita. Mas se estivesse, iria tratar a Justiça desta forma? Receber a PF a bala?
Pois é, mas, se quanto a Ciro Gomes, ninguém escreve o que fala, pois a fama de bravateiro vem de longe – embora ainda tenha gente capaz de aplaudir suas insanidades, como neste episódio referido –, o mesmo não se diga do ex-presidente Lula, este age de forma deliberada contra as instituições e suas insanidades, infelizmente, encontram eco no seio da sociedade. Aí mora o perigo.
O ex-presidente, sabedor que sua situação é indefensável e que os seus atos são passíveis de punição pela legislação penal, tem como estratégias de defesa dois pontos principais: hora apresenta-se com vitima de uma irmandade de conspiradores contra seu projeto libertário (a corrupção liberta!), hora afrontando as instituições da República.
O medo de ir para a cadeia – o que já teria acontecido em qualquer parte do mundo civilizado –, o faz colocar em risco os avanços conquistados até aqui, daí o seminário de elogio ao crime, daí a politização exarcebada de sua defesa.
O ex-presidente e os seus sabem dos crimes que cometeram, muitos já os confessaram (embora tentem ignorar isso, outros não demoram mais a fazê-lo), por isso tentam a todo custo trazerem o debate eleitoral do ano que vem para este ano. A ideia é: ainda condenado passar aos seus que foi injustiçado para não disputar as eleições.
A insanidade e ousadia dos foras da lei não conhece limites. Vai desde a inusitados comícios em velórios a seminários e debates com o propósito de inverter a lógica razoável das coisas, onde vendem criminosos como inocentes e policiais, procuradores e juízes, como inimigos da nação.
O próximo grande ato de ousadia criminosa já foi programado para dia 03 de maio, em Curitiba. Os audazes, com dinheiro dos trabalhadores, recolhidos através do imposto sindical e de outras formas, pretendem levar milhares de militantes, do país inteiro, para Curitiba na intenção de tentar intimidar a Justiça, que neste dia ouvirá o ex-presidente como réu numa das ações que responde.
Será que com isso pretendem obstruir a justiça e impedir a condenação do réu, caso existam provas suficientes? Será que pretendem informar a nação que os seus criminosos não merecem e não serão julgados por tribunais burgueses, como costumam dizer? Ou será que pretendem levar o país a uma guerra civil e lançar mão do poder de qualquer jeito?
O ato programado para Curitiba tem o propósito de intimidar as instituições do país. Mais uma prova clara de querem um país do avesso e com uma única verdade: a dos criminosos.
Abdon Marinho é advogado.

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