domingo, 27 de março de 2016

Abdon Marinho. As eleições de 2016 serão as primeiras em que estão proibidas as doações de empresas a candidatos.




QUEM escreve deve ter um mínimo de bom senso com aquilo que divulga. Hoje, com a facilidade de todo mundo divulgar o que pensa, essa responsabilidade é muito maior.
A chamada mídia digital, sobretudo, blogues e redes sociais estão em efervescência com o vazamento de uma lista apreendida na empresa Odebrecht. Trata-se de uma notícia que precisa ser tratada e ponderada, pelos motivos que passo a declinar abaixo:
As eleições de 2016 serão as primeiras em que estão proibidas as doações de empresas a candidatos.
Isso significa dizer que o nome de um político aparecer na lista de doações desta ou de outra empresa não é, necessariamente, um crime.
Acho até normal que políticos, sobretudo os com mais potencial eleitoral apareçam na lista das empresas. Repiso, até as eleições de 2014 todas as eleições eram financiadas assim: com doações empresariais.
As doações podem ter sido feito dentro lei e declaradas à justiça eleitoral. Este é um primeiro ponto.
O chamado “caixa dois” em campanhas eleitorais – embora se constitua em um crime –, sempre foi visto e tido como uma prática normal corriqueira. Muitas vezes as empresas queriam doar, por exemplo para um candidato da oposição e, por razoes óbvias, não quereriam aparecer. Faziam a doação com o compromisso desta doação não ser declarada a justiça eleitoral.
No modelo legal até então vigente, as empresas trabalhavam sem lado, ou seja, doando a todos para, no futuro, serem “bem vistas” por qualquer que fosse o governante.
O fato deste ou daquele político aparecer na lista de uma empresa não faz dele um corrupto ou “propineiro” ainda que o recurso tenha entrado na campanha e não tenha sido declarado à Justiça Eleitoral, ainda que não tenha sido contabilizado.
Como disse, até 2014, a legislação era tolerante com as práticas.
Na maioria das vezes o exame que se fazia das prestações de contas eram superficial. A Justiça Eleitoral confiava cegamente naquilo que informavam os candidatos. Tanto é assim, que não lembro de alguém que tenha deixado de assumir um mandato por suposta inconsistência em suas prestações de contas. O candidato fingia que prestava contas e a justiça fingia que acreditava. Esta sempre foi uma realidade nunca explicitada mas nem por isso menos verdadeira.
Esta permissividade trouxe um complicador extra para as eleições deste ano.
Explico: por força das alterações na legislação eleitoral, o limite de gastos em cada candidatura, em todos os municípios do Brasil, passou a ser definido pelo TSE, conforme definido pelo artigo 5º da Lei 13.165/2015.
Qual o problema? O problema é que para definir os valores que os candidatos poderão gastar, pegou-se por base os limites de gastos declarados nas eleições de 2012. Estes valores, ainda com as correções, os valores com os quais os candidatos poderão trabalhar são, comparados aos valores efetivamente gastos em eleições anteriores, baixos.
Exemplo: um candidato a prefeito de São Luís só poderá gastar R$ 2.348.995,90, no primeiro turno e, havendo segundo turno, R$ 704.698,77. Sei que os valores parecem elevados, mas para os diversos políticos com quem falei, estes valores não são suficientes para cobrir os programas de rádio e televisão, por exemplo. Se o maior município do Maranhão é assim, os demais os valores são bem menores. Em muitos, segundo dizem, o limite de gastos estipulado para prefeito não é suficiente para cobrir a despesa de uma campanha de vereador.
O exemplo acima serve apenas para ilustrar como eram feitas as campanhas no Brasil.
Quero dizer com isso, que nem toda doação de campanha é propina e, que, mesmo o chamado “caixa-dois”, ainda que ilegal, deve ser visto à luz do tratamento que sempre receberam ao logo dos anos, não se constituindo, também em propina.
Saber separar tais situações é bem importante para entender o que vem acontecendo no Brasil, onde os envolvidos nos esquema de corrupção desbaratado pela “Operação Lava Jato”, tentam colocar todos no mesmo patamar. Não é.
Situação bem diversa daquilo que está sendo descortinado pela operação referida. Nesta, temos pessoas nomeadas para cargos públicos com o claro propósito de, em conluio com empresários, superfaturar obras e serviços públicos e desviarem dinheiro público para estes funcionários e políticos, servindo tais recursos, também ou eventualmente para o financiamento de campanhas.
Perceberam a diferença? É bastante simples: propina é a quantia que se oferece ou paga a alguém para induzi-lo a praticar atos ilícitos; suborno.
A situação da propina não se enquadra em toda ou qualquer doação de campanha e/ou até mesmo de caixa dois, faz-se necessário a retribuição ou o sentido da troca. Eu lhe dou isso, em troca você me devolve aquilo.
Com isso, encerro dizendo que nem todos que aparecem na lista da Odebrecht ou que aparecerão noutras listas receberam propina ou que estas empresas, em todos os casos em que doaram, ainda que de forma oculta, estavam pagando propina. Cada caso é um caso e cada situação precisa ser escrutinada sob pena de cometer-se injustiças de difícil reparação.
A tentativa ou o interesse em colocar todos no mesmo balaio só interessa aquelas pessoas que acreditam que diluindo responsabilidades, dizendo: – olha fulano também fez –, acabe por excluir sua própria responsabilidade.
A honestidade dos formadores de opinião é uma necessidade que se impõe. Urge que aproveitem a páscoa para, ainda como reflexão, separarem o joio do trigo.
Abdon Marinho é advogado.

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