Abdon Marinho
SOU CONTRA a PEC 241, a chamada PEC do teto. Não é que seja contra a existência do teto dos gestos públicos – essa é uma causa que defendo há mais de vinte anos. Sou contra que o país tenha que colocar no seu texto constitucional algo que até uma criança de 08 anos é capaz de saber: ninguém pode gastar além do que tem.
Eu, você, sabemos que não podemos gastar mais do que ganhamos. Quando desobedecemos esta regra básica o resultado é quebrarmos, ficarmos insolventes, não conseguirmos pagar as contas e perdermos o crédito na praça.
Ainda há um agravante, enquanto nós, pessoas físicas, podemos fazer um ‘bico”, arranjar um trabalho extra num momento de aperto ou mesmo nos socorrer com um empréstimo, em último caso, os governos não podem.
O Estado não produz riquezas, não “faz” dinheiro. Os recursos que usam são fruto dos impostos que pagamos. Os cidadãos brasileiros já passamos quase seis meses do ano trabalhando unicamente para pagar impostos. Apesar disso, esses impostos não têm sido suficientes para fazer face aos gastos do governo, como resultado, a previsão é que fecharemos o ano com um déficit de 170 bilhões de reais.
Aos governos, para fechar as contas, restam duas alternativas: reduzir os gastos ou aumentar os impostos que pagamos e que já são altos, sobretudo, se comparamos ao retorno que temos.
A PEC da discórdia sequer prega a redução de gastos: propõe que, pelos próximos vinte anos, os gastos públicos tenham por base o gasto do ano anterior, mais a correção. A proposta, a longo prazo, visa o equilíbrio das contas públicas. Não é isso que se faz as nações com economias sólidas? Não é o desejável?
Os que hoje se batem contra a medida são, em grande parte, os que estavam no poder até ontem e não apresentaram qualquer solução, exceto o aumento de impostos a uma classe produtiva já asfixiada por tantos tributos. Na oposição bradam por outras alternativas que em treze anos de poder não tiveram condições ou competência para implementar. Até porque, não existe milagre em economia, dinheiro não brota em árvore (não em sentido literal). Solução só nos moldes delineados: redução de gastos ou aumento de tributos.
São muitos os que repetem o discurso contra os bancos, os ricos, não questiono a necessidade de pagarem mais impostos, entretanto nada disso terá qualquer sentido se os governos continuarem gastando como se tirassem dinheiro de um saco sem fundo. Neste contexto, colocar ricos contra pobres, como sempre fizeram, não passa de uma fuga pela tangente ou, como se diz na minha terra, conversa mole para boi dormir.
Na verdade, o que se fez foi estimular o descontrole dos gastos públicos inclusive afrontando a Lei de Responsabilidade Fiscal (LC 101/2000). O desperdício dos recursos públicos, quer dizer, dos nossos recursos, alcança, indistintamente, todos os poderes. Qualquer desavisado fica perplexo com a suntuosidade dos prédios públicos, principalmente daqueles destinados à Justiça e ao Ministério Público – logo os dois que deveriam ser mais parcimoniosos. E o desperdício não se materializa apenas na suntuosidade de suas instalações, passa também pelas infinitas regalias, inclusive aquela imoralidade do afastamento pelo cometimento de “malfeitos”, onde o afastado – provisório ou definitivamente – permanece recebendo proventos integrais. Tem muitos que faz é torcer por tal punição.
O desperdício é generalizado no estado paquidérmico. São serviços médicos e odontológicos exclusivos – que passam a maior parte do tempo ociosos –, carros oficiais,
motoristas, seguranças, residências oficiais ou auxílios moradias, sem contar os diversos outros mimos pagos com recursos públicos e inacessíveis a quem os paga.
Certa vez li que teve/tem órgão mantendo, às expensas do contribuinte, até serviços de depilação íntima. É isso mesmo, pagamos até a depilação dos fundilhos de suas excelências. Claro, que devo desculpas pelo termo chulo, mas é necessário para que entendermos o país surreal em que vivemos.
São mordomias incompatíveis com a realidade do país e da decência. Isso, sem contar que cargos públicos – nos três poderes e em todas as esferas –, estão entre os mais bem pagos em todo mundo.
Basta ver quanto custa um juiz brasileiro, um deputado, um vereador e comparar com seus congêneres noutros países. Vejam os penduricalhos dos cargos; quanto custa o funcionamento da máquina.
Qualquer um que não enxergue a necessidade de acabarmos com esse tipo de coisa só pode está acometido por alguma cegueira ideológica. Não faz sentido que um governo, qualquer governo, não possua limites de gastos, não sofra com rigorosas verificações e controles.
Os críticos ao controle ou estão sendo enganados ou não vivem no Brasil real. Temos uma educação pública na rabeira do mundo, uma saúde onde as pessoas morrem de moléstia que já deviam ter sido erradicadas desde o século passado, onde mulheres morrem de parto porque não lhes dispensam o atendimento adequado, onde os pacientes morrem enquanto aguardam o atendimento ou uma cirurgia. E, noutra quadra vemos o dinheiro público sendo gasto com supérfluos, com mordomias ou simplesmente sendo desviados devido à falta de controle.
A PEC do teto de gastos é tímida e só terá alguma eficácia se vier com diversas outras reformas. Embora seja contra esse atestado de irracionalidade, já é um começo.
O que precisamos entender é que o Brasil clama – para funcionar como se deve –, por uma reforma do Estado (já dissemos isso noutras oportunidades), com redução da máquina pública, com redução da representação política, dos cargos comissionados e funções gratificadas, com o fim das mordomias, da suntuosidade faraônica.
A análise sensata da situação em que o país se encontra clama por estes enfrentamentos. A menos que acreditemos em milagres, que alguém com uma varinha mágica fará os nossos problemas desaparecerem, teremos, sim, que tomar medidas drásticas de contenção de gastos, de zelo com o dinheiro público (nosso), de enfrentamento das corporações que não querem perder privilégios vergonhosos.
O que está em jogo é o destino do Brasil. A população precisa repudiar de forma veemente esse ideologismo que só atrapalha o país e que chega ao absurdo de se rejeitar medidas que foram apresentadas até pelo governo que acabou de sair.
Um exemplo foi o que aconteceu, outro dia, com a votação do FIES. Milhares de estudantes dependem do financiamento estudantil. O governo anterior usou e explorou esta bandeira a não mais poder, inclusive dizendo que o governo que os sucedeu iria acabar com ele.
Pois bem, o governo sem orçamento, encaminhou proposta de 700 milhões para o financiamento estudantil e os chamados defensores da conquista não só obstruíram a votação como votaram contra.
O comportamento desumano nos leva a pensar que o FIES, antes de ser um bem para os
estudantes, na verdade, nunca foi além de uma bandeira para ser explorada politicamente. Se não estão mais no poder, os estudantes poderão passar sem o financiamento. É isso que provam com o comportamento que tiveram.
Acredito que já passa da hora de pensarem no Brasil e nos brasileiros. Já passa da hora de acabarem com esse bolorento discurso de que só eles são bons e têm a solução. Já mostraram que não têm solução para nada.
O Brasil precisa alcançar o século vinte um. Os debates são os mesmos do século dezenove, com esse ideologismo tosco e tolo que ignora as reais necessidades do povo.
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