ARTIGO: LOCKDOWN na visão de Carlos Lula
Teremos mais um anglicanismo para incorporar ao vocabulário cotidiano. Mais um termo estrangeiro a ser utilizado nas nossas conversas e preocupações. E o Maranhão, pelo seu vanguardismo rotineiro, será o primeiro estado brasileiro a adotar o “isolamento total”, chamado na grande mídia nacional e internacional como lockdown.
Com o anúncio do isolamento, o maranhense lançou várias teses e comentários. Um desses veio por áudio sugerindo que talvez na baixada seja usado no registro de nascimento de alguém. De fato, a palavra é diferente. Por não ser usual causa certa estranheza, mas o objetivo é simples. Na Grande Ilha, o isolamento total pode desacelerar o preocupante contágio do novo coronavírus.
Queria falar um pouco sobre a velocidade das coisas que vivemos nas últimas semanas. O relógio da vida corre mais rápido desde a pandemia. O dia não tem mais 24 horas. Nas unidades de saúde descobrimos que o vírus pode transformar algumas horas nas últimas de uma vida.
O Brasil não aguentaria ver tão de perto um episódio de plantão hospitalar durante o coronavírus. Não há paz em alas de UTI, não há descanso. Alguns médicos já dormem na unidade para reduzir o tempo entre atender um socorro e outro. No coronavírus, os milésimos de segundos contam. O dia sempre está em contagem regressiva.
Fora do ambiente hospitalar e, talvez, alheios demais aos sofrimentos de um paciente grave, maranhenses lotam ruas do centro, estão aglomerados em frente aos bancos, nos botecos dos bairros, marcam partidas de futebol, visitam familiares e amigos, passeiam. Uma senhora xinga o Governador. Queria comprar duas sungas. Exaustos, profissionais de saúde partem para seus plantões e observam sem entender qual é o motivo da atitude destes que insistem em viver a vida como se nada estivesse acontecendo. Aqui na secretaria de saúde ficamos nos perguntando: por que as pessoas ainda minimizam os efeitos dessa doença?
Por ser de rápida transmissão e, até o momento, sem cura, diariamente insistimos na importância do distanciamento social. Quanto mais isolados, menor o contágio. A medida é importante para evitar o adoecimento coletivo, que garante mais tempo para o sistema de saúde preparar novos leitos para atender mais pacientes, mas não todos ao mesmo tempo.
Ainda assim, vimos nos últimos dias que o vírus se espalhou ainda mais rápido pelo continente. Chegou a cidades que possuem menos de 10 mil habitantes, como Milagres do Maranhão. Talvez alguém olhe o número de três casos e argumente que é baixo, mas um estudo recente realizado pela Universidade Federal de Pelotas, no Rio Grande do Sul, concluiu que o número de infectados pode ser 12 vezes maior do que os casos notificados. Este estudo, no entanto, foi realizado em um estado que tem cumprido rigorosamente o isolamento social.
Infelizmente, a insensatez e o sentido de liberdade deturpado, sobretudo na Grande Ilha, nos trouxeram a este instante. O lockdown não é apenas uma peça jurídica, mas uma medida para manter as pessoas seguras quando elas mesmas não compreendem ou não querem compreender sobre os riscos deste vírus.
Eu poderia discutir quais os impactos de uma medida como essa, a longo prazo, para o nosso sistema de justiça e de como ela pode ser perigosa se utilizada em contextos políticos polarizados. Mas não me parece o caso. Eu insisto: não estamos em tempos normais. Corremos contra o tempo para garantir a vida daqueles que amamos, e daqueles que sequer conhecemos.
A medida do lockdown, apesar das polêmicas no entorno, pode evitar o colapso da rede pública de saúde, enquanto mantemos o ritmo de trabalho na ampliação de novos leitos, contratação de mais equipes de saúde, compra de equipamentos e insumos. Há obras ocorrendo simultaneamente na capital e interior do estado. Nossa capacidade de atendimento aos casos de Covid é ampliada semanalmente, mas existe um limite físico. Precisamos barrar o contágio enquanto há tempo.
Hoje a capital conta com leitos no Hospital Dr. Carlos Macieira (HCM), Hospital de Cuidados Intensivos, Hospital Dr. Genésio Rêgo, Hospital de Traumatologia e Ortopedia, leitos de retaguarda do HCM localizados no Hospital Nina Rodrigues, Hospital da Vila Luizão, além do Hospital Real.
No interior, nossas unidades também destinaram leitos, mas enquanto o bloqueio ocorre na Grande Ilha, os prefeitos das cidades fora dela precisam conter a população. Do maior ao menor município, o risco do novo coronavírus é o mesmo. Seremos aqueles que comemoram o número de recuperados a cada 24 horas ou aqueles que choram o aumento desenfreado de mortos?
Minard
Minard
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