sábado, 22 de novembro de 2014

Flávio Dino é o primeiro político comunista a eleger-se governador no Brasil, vencendo o candidato da família Sarney — Lobão Filho (PMDB) — com 64% dos votos válidos já no primeiro turno.



A Sobrevida de Sarney, depende do nosso governo diz Dino!

John Cutrim
Flávio Dino é o primeiro político comunista a eleger-se governador no Brasil, vencendo o candidato da família Sarney — Lobão Filho (PMDB) — com 64% dos votos válidos já no primeiro turno. Mas o ex-juiz federal, ex-deputado e ex-presidente da Embratur sabe que a vitória foi apenas o primeiro passo. Ele diz que tem dois grandes desafios nos próximos quatro anos. O primeiro é melhorar os indicadores sociais do Maranhão, que detém um dos piores Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do país, ao lado de Alagoas e Piauí. O segundo, é sepultar a hegemonia política do clã Sarney, desde os anos 60 no poder local. “A sobrevida deles depende do nosso desempenho no governo”, sentencia.
Qual o significado de sua vitória sobre o clã Sarney?
Tem um grande significado para o Maranhão, pelo que representa a permanência no poder, pela hegemonia dos Sarney. E tem significado nacional ao mostrar que as instituições políticas e democráticas do Brasil, aos trancos e barrancos, ao modo brasileiro, estão evoluindo, na medida em que ele (Sarney) representava ainda a persistência de traços do coronelismo de meados do século XX. No Maranhão, temos determinadas precondições para o desenvolvimento econômico que não se realizavam exatamente por causa do poder político que impedia que os investimentos públicos e privados continuados, consistentes e planejados ocorressem. A situação de pobreza do estado, que detém alguns dos piores indicadores sociais do país, está diretamente associada à política.
No Maranhão e no Amapá, outros adversários dos Sarneys que venceram as eleições tiveram dificuldade de manter seus mandatos…
A família Sarney mantém uma presença na política maranhense. É um grupo que tem sua identidade consolidada há muito tempo, com uma força midiática e econômica muito forte, com muitos aliados em todos os níveis. Não temos a ilusão de que será um governo isento de conflitos, mas o que desejamos é que sejam conflitos dentro dos parâmetros democráticos. Ou seja, diferente do que aconteceu com a cassação do governador Jackson Lago, que haja um respeito à eloquente e clara vontade das urnas. O clã Sarney continua a ter sua força, apesar da maior derrota eleitoral de sua história. Terei cuidado, sabendo que eles continuam à espreita, desejosos de retornar ao poder, dispostos a retomar os privilégios que perderam.
A transição já começou?
Nós tomamos a iniciativa, formamos uma equipe de transição. Mas não houve muita receptividade por parte da governadora Roseana Sarney, que até hoje não prestou as informações que solicitamos há cerca de 40 dias. Mesmo assim, estamos avançando na formação da equipe e na busca de diálogo com os atuais secretários.
Esse já é um primeiro conflito?
Interpretamos essa postura como um indicativo de que os Sarney consideram que o aparelho governamental é uma espécie de propriedade familiar. Infelizmente, houve tentativas de criar embaraços e constrangimentos a partir de 2015, como despesas não previstas, licitações inexplicáveis, lançar obras que não foram devidamente planejadas. Diante disso, temos buscado informações para evitar que ocorram coisas absurdas que possam gerar bombas a explodir no ano que vem. Recentemente eles tentaram terceirizar todo o sistema penitenciário do Maranhão, com uma licitação que nós conseguimos suspender na Justiça, que teria o custo mais alto de todo o país, mais de R$ 8 mil mensais por detento, duas vezes superior à média brasileira.
Qual é a situação financeira do Maranhão?
Do ponto de vista estrito da relação dívida-orçamento-custeio, temos uma situação boa em comparação a outros estados. Temos condições de manter a máquina funcionando — o que em alguns estados nem isso é possível — e temos certo nível de investimento. Mas também pretendemos buscar transferências voluntárias. Estamos nos preparando para apresentar projetos técnicos, visando captação de recursos públicos. Por outro lado, devemos buscar eventuais operações de crédito com organismos multilaterais internacionais, e mesmo com o BNDES, porque naturalmente o desafio de melhorar o IDH do estado exige uma soma de recursos muito maior do que as receitas estaduais, por mais que haja esse equilíbrio fiscal. Nós vamos precisar de investimentos públicos, por exemplo, para melhorar a distribuição de água — que é a pior de todas — e para combater o déficit habitacional, que é de 450 mil moradias. Por outro lado, também é necessário avançar nas parcerias com o setor privado e criar um ambiente institucional favorável aos negócios — que hoje, infelizmente, não há, ao contrário, o que há no estado é um ambiente muito hostil, na medida em que a competitividade é atrelada aos fatores políticos.
O sr. pretende dar um choque de capitalismo no Maranhão?
É o que tenho chamado de revolução democrática burguesa (risos). Uma agenda iluminista, de 300 anos atrás na Europa, e que a gente precisa cumprir no Maranhão. O próprio setor privado, submetido a chantagens, benefícios indevidos, cobranças, jeitinhos, desestimula a existência de um mercado saudável. Durante a campanha, sempre que me perguntavam se o grupo Sarney tinha medo do comunismo, eu dizia que ele tinha mais medo do capitalismo.
Qual será a cara de sua gestão?
Em primeiro lugar, tirar o Maranhão das páginas policiais. Isso é o nosso desafio número 1, que está atrelado a duas questões emergenciais. A primeira é essa questão da Penitenciária de Pedrinhas; e a segunda é a temática da transparência, da probidade, da honestidade. Queremos quebrar com esse estigma nacional de que o Maranhão é um estado problema. Ao mesmo tempo, queremos executar um projeto de desenvolvimento inclusivo. Queremos chegar em 2018 com indicadores sociais do Maranhão melhores.
Como o sr. imagina sua relação com o governo federal, considerando que Dilma e o PT ainda mantêm uma aliança política com a família Sarney?
É preciso considerar que eu sou de um partido que apoia o PT desde 1989, desde a primeira candidatura do Lula. Eu mesmo participei de campanhas de Lula e Dilma em vários momentos. Então, do ponto de vista político, eu não consigo imaginar embaraços… Nós vencemos a eleição, é importante lembrar isso.
Como foi o comportamento de Dilma e Lula na campanha?
A Dilma se manteve neutra e Lula apoiou o filho do ministro (das Minas e Energia) Edison Lobão, o Edinho Filho.
Lula deixou mágoa?
Mágoa não, eu compreendo que faz parte da opção política dele, que eu considero equivocada. Eu não levo para o terreno pessoal. Dilma manteve uma atitude de neutralidade — o que eu acho positivo. Uma parte significativa do PT nos apoiou, inclusive já indiquei um quadro do PT para ocupar a Secretaria de Direitos Humanos do Estado, e haverá outras pessoas do PT na nossa gestão. Pela soma dessas questões, acho que não haverá embaraços políticos entre nós. Não espero, nem pleiteio, favorecimentos. Mas acredito que a presidente Dilma tem a compreensão de que o Maranhão é um grande desafio nacional.
Como está a obra da Refinaria Premium I?
Na verdade, ela não foi rigorosamente prevista no PAC. O projeto foi uma tentativa do senador Sarney e do ministro Edison Lobão de mais ou menos impor uma agenda, a partir dos seus interesses políticos, mas não havia um planejamento real. Infelizmente, isso consumiu R$ 1,5 bilhão. A obra está paralisada há três anos. Hoje, na agenda de investimentos da Petrobras, a previsão é de que a refinaria fique para 2029. Serenada essa crise da Petrobras, vamos retomar o diálogo com a estatal para que o estado se coloque como parceiro real nesse projeto.
O Maranhão é o quarto estado do Nordeste em previsão de investimentos pelo PAC. A dimensão dos investimentos é adequada?
Quando se exclui o projeto da rerfinaria, o montante cai drasticamente em relação a outros estados. Mas nós achamos que o Maranhão deve apresentar projetos melhores para captar mais recursos do PAC e de outras fontes do governo federal. A questão essencial hoje do Brasil, não só do Maranhão, é a questão da qualidade dos projetos. Vamos montar uma estrutura exclusiva para se dedicar a isso, visando melhorar a captação de recursos e a execução das obras. Eu examinei as transferências de recursos para os projetos do Maranhão, não só do governo do estado, mas também dos municípios, que tramitaram nos últimos anos no governo federal, e percebi que o índice de execução é de apenas 25%. Cerca de 75% é captado, mas se perde, exatamente no projeto, na licitação, na formalidade burocrática, em alguma questão jurídica.
Como o sr. vê o cenário político nacional, com o enfraquecimento do PT e o novo Congresso que virá em 2015?
A formação de diversos blocos é um imperativo, fruto da fragmentação partidária. Hoje no Congresso, todos os partidos são pequenos ou médios. O maior de todos é o PT, que tem pouco mais de 10% dos deputados. O PCdoB deve se integrar a um dos blocos, como fizemos na legislatura passada com o PSB. Mas tem de ser coerente com a nossa visão política geral de apoio geral ao governo. Eu, como militante da esquerda brasileira, espero que o PSB esteja conosco. Se olharmos das jornadas de junho de 2013 para cá, o pensamento conservador se fortaleceu no Brasil. Há aspectos desse pensamento que são altamente preocupantes, quando, por exemplo, um pequeno segmento da população imagina que o caminho é um golpe militar. É muito grave quando há uma exacerbação do ódio como instrumento de luta política. Uma parte da esquerda põe a culpa na mídia. Se fosse só isso, a internet serviria como fórum do pensamento de esquerda, e não é. Claro que existe a questão do comportamento dos grandes grupos de imprensa, mas é reducionista explicar tudo por aí. Se os grandes grupos de mídia tivessem esse peso todo, Lula e Dilma não teria sido eleitos e reeleitos. A esquerda brasileira perdeu um pouco de sua identidade, por ingenuidade. No plano federal, algumas vezes, ao invés de um balanceamento, houve uma submissão ao jogo tradicional. Isso acaba nos tragando, porque, quando você passa determinadas fronteiras, é difícil voltar. Não acho que a culpa é do Lula ou da Dilma. Acho que nós todos fizemos concessões demais. O primeiro ponto é o PT voltar a aglutinar a esquerda. Eles escolheram o PMDB como parceiro preferencial e essa é a origem de todos os males. Isso tornou o PT parte de um conjunto chamado peemedebismo. O PT é a força hegemônica da esquerda brasileira desde a sua fundação e por isso deve colocar como meta voltar a unir as forças progressistas. É possível governar com o PMDB em outras bases. É melhor ter o pensamento progressista aglutinado, desobstruir o diálogo com o PSDB e depois negociar com o PMDB, do que fazer um consórcio de poder com eles.

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